Terramar apoia campanha nacional Maio Laranja.

Neste dia 18 de maio nós, do Instituto Terramar, nos juntamos à agenda nacional do Maio Laranja para nos manifestar sobre a urgência de combater o Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. Os dados produzidos sobre esse assunto são dolorosos e revelam parte dessa dura realidade. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022, crianças de até 13 anos são as maiores vítimas dos crimes de estupro registrados no país, chegando à alarmante estatística de 60% no ano de 2021. Foram pelo menos 45.076 vítimas em 2021 de 0 a 17 anos, com prevalência entre crianças de 5 a 9 e pré-adolescentes de 10 a 14.  Esse tipo de violência, que segue crescendo no Brasil, atinge geralmente meninas no espaço doméstico e é cometido por pessoas conhecidas ou de confiança da família. 

Outros tipos de violência sexual, mas com baixa incidência de registro ou com registros não integrados, são os delitos cibernéticos de pornografia e a exploração sexual infanto-juvenis. Ainda assim, em 2021 foi registrado que quase 1.800 crianças e adolescentes foram vítimas da pornografia e 733 de exploração sexual no país. Segundo os dados do Disque Denúncia, nesse mesmo ano de 2021 foram ao todo 30.604 denúncias de violações de direitos humanos de crianças de até 6 anos como um todo, número que cresceu enormemente ano de 2022, quando somente no primeiro semestre foram recebidas 25.377 denúncias. Para além do perfil das crianças vitimadas, considerando aspectos de gênero e raça, o caráter cotidiano, o espaço em que geralmente essas violências acontecem e a autoria da maioria delas constituem uma verdadeira ferida na nossa sociedade. 

Falar desse tema é também falar na diversidade de infâncias, adolescências e juventudes e a necessidade de considerar aspectos específicos tanto para promoção de políticas públicas que almejam a garantia do direito à uma vida digna e boa em seus múltiplos aspectos quanto para o combate das várias formas de violência e como elas se expressam em diferentes contextos e realidades sociais. 

Na Zona Costeira do Ceará, nos territórios tradicionais, pesqueiros, rurais, quilombolas, crianças e adolescentes, para terem uma vida boa em sua plenitude, necessitam: da garantia ao direito à educação diferenciada, que contemple na forma e no conteúdo seus modos de vida; do acesso à saúde contextualizada; da garantia da segurança alimentar sua e de sua família e comunidade, com destaque ao alimento que vem da pesca artesanal, da cata de mariscos e da agricultura familiar; do direito à terra e à justiça; do direito ao livre acesso ao território; do direito ao ambiente saudável; do direito à água; do direito de acessar as tecnologias ancestrais produzidas no território, ofícios, saberes e cultura de seu povo; do direito à comunicação; do direito de se locomover dignamente; de mães fortalecidas, com autonomia e saúde mental; de uma vida livre da violência e da criminalidade,; do direito à sua história e do fortalecimento do seu pertencimento étnico-racial e o acesso à informações para sua proteção e autoproteção em relação à violência sexual e de gênero. 

No entanto, essas crianças e adolescentes têm se deparado com uma realidade muito diferente: a presença de megaempreendimentos e de um estado desenvolvimentista que geram conflitos socioambientais e agrários nos territórios tradicionais da Zona Costeira criam novas hierarquias, relações de poder e reestruturam as violências muitas. As comunidades costeiras têm visto nas últimas décadas a chegada massiva de pessoas estranhas nos seus territórios, sejam atraídas pelo turismo, seja para trabalhar em canteiros de obras ou, ainda, reivindicando partes do território como proprietárias, ao passo em que veem suas juventudes debandando para as cidades por falta de oportunidade. A chegada de homens para trabalhar em empreendimentos eólicos reconfigura o sentido de maternidades solo, com uma grande quantidade de crianças nascidas e abandonadas pelos genitores, os chamados “filhos dos ventos”. O turismo sexual tem sido realidade em muitas praias, os empreendedores têm incidido enormemente nas escolas, a segurança alimentar e o livre acesso ao território está comprometido.

Repudiamos toda e qualquer forma de abuso/exploração contra nossas crianças e adolescentes em qualquer território. A sociedade civil precisa urgentemente quebrar o silêncio envolto do pacto entre adultos e internalizar que essa é uma questão não só da polícia, mas de todos os organismos que compõem nossa sociedade e que almejam um futuro seguro e digno para nossas crianças e adolescentes.

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Fontes:

1. https://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2022/06/anuario-2022.pdf?v=15

2. https://ncpi.org.br/wp-content/uploads/2023/03/NCPI_WP10_Prevencao-de-violencia-contra-criancas.pdf