Flexibilização para emissão de licenças abre caminho para crimes ambientais no Ceará
O Conselho Estadual do Meio Ambiente (Coema) aprovou, no dia 11 de abril, uma resolução que altera o processo de licenciamento ambiental no Ceará.
A nova normatização, formulada pela Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace), alcança todos os empreendimentos públicos e privados no estado. Diante das substanciais alterações apresentadas – especialmente no que se refere a 1) flexibilização das atuais modalidades de licenças; 2) da criação de novas modalidades de licença; 3) da ampliação significativa de casos em que há dispensa do licenciamento; 4) da proposição do aumento de prazo de validade de licenças e da ampliação da prerrogativa da autodeclaração para a renovação do documento –, movimentos e organizações ambientais têm manifestado grande preocupação com os impactos que a aprovação da nova resolução acarretará.
Os principais argumentos apresentados pela Superintendência na defesa da resolução se referem a desburocratização dos processos de licenciamento e ao foco de atuação do órgão no pós-licenciamento e monitoramento.
Para os movimentos e organizações da sociedade civil, a fragilização do licenciamento sob a alegativa de simplificação representa insegurança jurídica e o desmonte da legislação ambiental, visto que o que se observa é o alinhamento entre a proposta estadual e as que estão sendo debatidas a nível nacional. “O licenciamento ambiental é instrumento fundamental para a prevenção de danos ao meio ambiente e a coletividade. É, na atualidade, o principal instrumento da política de meio ambiente, e nos preocupa sua flexibilização em um momento de crise civilizatória, quando se deveria trabalhar no controle de danos e riscos ambientais. Para sublinhar esses danos e riscos recordamos o recente crime ambiental do rompimento da barragem Mina do Feijão em Brumadinho operada pela Vale, levando a morte de 225 pessoas e a irremediável perda de toda a biodiversidade do Rio Paraopeba, atingindo agora o São Francisco, e o caso de Mariana com a mesma empresa Vale sendo responsável pela tragédia. É nítido o quanto o licenciamento é essencial para resguardar a principal característica do meio ambiente, que é essa impossibilidade de reparação. Por isso a lógica prevalente deve ser a de prevenir os danos, em vez de deixá-los acontecer para depois tentar repará-los, quando é possível. Isso é o que diz o Princípio da Precaução, adotado no Brasil desde a Constituição de 1988 e a Eco 92”, aponta um trecho de Carta Pública formulada pelas organizações.
Acesse aqui, na íntegra, o documento assinado por dezenas de organizações locais e nacionais: ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL DENUNCIAM A FLEXIBILIZAÇÃO DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL NO CEARÁ
Aprovação e protesto
A resolução foi aprovada em reunião do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Coema), no dia 11 de abril, realizada no auditório da Semace. Movimentos e organizações da sociedade civil participaram da reunião com o objetivo de manifestar a crítica e a preocupação com a resolução, além de dialogar com os 37 membros do Conselho.
Foto: Cartazes que questionam a resolução da Semace.
Pontos críticos da nova resolução
– Aumento das categorias identificadas como de baixo impacto de 22 para 43;
– Carcinicultura e comercialização de agrotóxicos identificadas como atividades de médio impacto;
– Plantio com utilização de agrotóxicos em imóveis em até 30 hectares com dispensa de licenciamento ambiental;
– Foco da resolução é o automonitoramento ou “autofiscalização” do empreendedor que vai apresentar seu laudo para o órgão licenciador;
– Alteração na legislação ambiental por resolução, quando o processo deveria se dar por meio da votação de Projeto de Lei pela Assembleia Legislativa, uma vez que se está criando uma série de novos tipos de licenças ambientais que não existiam na legislação federal ou estadual, ampliando casos de dispensa de licenciamento e também do sistema de autodeclaração;
– Processo sem escuta e participação de populações tradicionais que serão diretamente afetadas pela resolução, com destaque para o acirramento de conflitos no campo e zona costeira.
Para mais informações sobre o caso, acesse a matéria Decisão de Conselho flexibiliza licenciamento ambiental no Ceará, publicada no jornal Diário do Nordeste e o artigo O Coema e a segunda morte de Zé Maria do Tomé, de João Alfredo Telles Melo (professor de Direito Ambiental e presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB/CE), publicado no jornal O Povo.