Manifesto Suprapartidário sobre o Contexto Eleitoral no Brasil

Fortaleza, 13 de Setembro de 2018

Vivemos um dos piores momentos da história política do Brasil. Iniciado em 2014, o golpe institucional, cujo ápice foi o Impeachment da presidenta Dilma em 2016, revelou para que e para quem a maioria dos deputados e senadores legisla no país. Na votação do Impeachment, a maior parte dos deputados federais declararam seus votos em nome do bem estar de seus próprios familiares, de suas inserções religiosas e ideológicas, incluindo o elogio a torturadores de mulheres e crianças.

Mas isso não é para menos: “62% da Câmara é formada por deputados originários de famílias políticas, enquanto no Senado esse número sobe para mais de 70%. Ou seja, praticamente dois terços do Congresso brasileiro estão tomados por algumas famílias. Mais da metade dos ministros de Temer são representantes dessas famílias políticas”¹.

Esses mesmos políticos também representam os interesses de setores privados, dos quais são mandatários, seja por terem domínio econômico nesses setores ou por estarem a serviço daqueles que financiam suas campanhas políticas.

Não é atoa que nas eleições de 2014, 70% dos deputados federais eleitos foram financiados por 10 grandes empresas (JBS, Bradesco, Itaú, OAS, Andrade Gutierrez, Odebrecht, UTC, Queiroz Galvão, Grupo Vale e Ambev), em sua maioria está envolvida em esquemas de corrupção. Além disso, as bancadas do Boi, da Bíblia, da Bola e da Bala na Câmara Federal e Senado expressam interesses por dinheiro, poder e riqueza, associados à incitação à violência, manipulação da informação, da consciência e do inconsciente dos indivíduos e da coletividade.

Apesar do discurso patriótico e nacionalista, governos, deputados e senadores tomam para si e suas famílias e aliados nacionais e internacionais, o patrimônio público e os bens comuns: terra, florestas, petróleo, energia, água e demais riquezas da soberania nacional. A política de austeridade fiscal explora as desigualdades, penaliza gravemente as classes trabalhadoras e favorece os banqueiros, os rentistas, as grandes corporações internacionais e os setores nacionais privados.

Em dois anos, a população brasileira sofreu com o desmonte de políticas públicas e perdas de direitos (trabalhista, saúde, educação, assistência social e do meio ambiente) conquistados, tendo a previdência social sob constante ameaça. O país está voltando para o Mapa da Fome e avolumou estatísticas de pessoas em situação de rua; violência extrema do Estado e da sociedade racista; o agravo da insegurança pública que se acirra com o empobrecimento, o desemprego (e os investimentos da indústria armamentista) concretiza o projeto de extermínio de pobres, pretos, indígenas, mulheres, LGBTQ+, movimentos camponeses e urbanos e militantes sociais de modo geral.

Mesmo praticando todas essas violências contra a maior parte da população, políticos e servidores golpistas apostam que o povo não é capaz de pensar, tanto que nas Eleições 2018, grande parte deles se coloca para reeleição e/ou busca manter e estender seus poderes elegendo filhos e netos. Em parceria com o governo ilegítimo, os políticos golpistas seguem violando a democracia, amparados pelo poder judiciário e grande mídia. Todos de tradição nepotista e posicionados como classes ricas e brancas.

Diante desse contexto, nos manifestamos por entender que nas Eleições 2018 uma resposta popular precisa ser dada, por isso não votaremos em:

Golpistas, que recorrentemente têm votado contra os direitos da população;

Representantes de famílias políticas que vivem e constroem patrimônio privado por meio da política;

Ruralistas, que têm explorado e expropriado territórios, terra, água, ecossistemas e biodiversidade;

Empresários da indústria armamentista, cujo interesse é manter e aumentar a violência para garantir mercados de armas, privatização de unidades prisionais e lucro com a insegurança pública;

Banqueiros e elites que se vendem como gestores “não políticos” para fortalecer a classe rica da qual fazem parte, tornando a gestão pública um negócio;

Políticos militares que disseminam o ódio e violência como solução para os problema do país;

Lideranças religiosas conservadoras, cujo interesse é manter os sistemas de violências contra negros/as pobres, mulheres, povos indígenas e LGBTQ+, explorando e enriquecendo às custas da fé do povo e dos privilégios políticos.

Mas, acreditamos que vale fortalecer e eleger candidaturas que nos representam em nossa diversidade, que conheçam a realidade da vida, os problemas e as potências dos povos e que estejam comprometidas com o bem comum. Apoiar e votar em mulheres e homens cujo histórico de atuação demonstra preocupação e práticas contra as desigualdades e injustiças; candidaturas camponesas, quilombolas, feministas, negras e indígenas; candidaturas LGBTQ+ e de outras minorias que historicamente tiveram seus direitos civis e políticos interditados pela discriminação, o racismo e violência naturalizada.

Reconhecendo os limites da política institucional, a luta popular por meio do voto consciente, crítico e solidário é um dos instrumentos de resposta e um movimento positivo na correlação de forças a favor da população. Não resolve nossos problemas, mas pode ser um exercício para movimentar as esperanças por dias melhores.

Assinam este manifesto:

Articulação Nacional das Pescadoras (ANP)

Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP)

Instituto Terramar

Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP)

¹ Revista Eletrônica The Intercept Brasil, disponível em: <https://theintercept.com/2018/09/02/familias-tradicionais-dominam-a-politica-brasileira-e-isso-nao-tem-hora-pra-acabar/>