Carta Ceará Antinuclear: em defesa da vida, da água e por justiça ambiental
CARTA
Aos(às) brasileiros(as), aos movimentos sociais nacionais e internacionais, às organizações da sociedade civil, ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), ao Sistema de Justiçae a todos(as) os(as) que se comprometem com a defesa dos direitos à vida, à água, à saúde, à terra, ao território, ao trabalho decente, à alimentação e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
INTRODUÇÃO
Um consórcio de empresas prevê instalar no Ceará uma mineração de urânio e fosfato que tem sido denominada Projeto Santa Quitéria. O empreendimento traz consigo um conjunto de violações de direitos e, atualmente, passa por um processo de licenciamento ambiental no âmbito do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA).
Em virtude da falta de discussão pública que envolve o projeto e dos impactos e dos riscos que ele pode trazer aos direitos socioambientais, esta carta objetiva sintetizar informações sobre suas principais irregularidades e convocar o apoio nacional e internacional para requerer à DIREÇÃO DO IBAMA a responsabilidade técnica, ética e política de indeferir o licenciamento ambiental da mineração de urânio e fosfato no Ceará.
PROJETO DE MINERAÇÃO DE URÂNIO E FOSFATO SANTA QUITÉRIA – SÍNTESE DOS IMPACTOS, DOS RISCOS E DAS IRREGULARIDADES
No semiárido cearense, entre os municípios de Itatira e Santa Quitéria, a 222 Km de Fortaleza, está localizada a Jazida de Itataia. Com reservas lavráveis totais de 65,6 milhões de toneladas de colofanito – minério onde urânio e fosfato estão associados -, a jazida constitui-se como a maior mina de urânio do Brasil.
Chamada de “dragão adormecido” pelas comunidades do entorno, foi descoberta na década de 1970 e, desde então, tem sido alvo de intervenções que nunca foram discutidas com a população. Atualmente, um consórcio firmado entre a estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB) e a Galvani Indústria, Comércio e Serviços S.A (controlada pela mineradora norueguesa Yara) deseja explorá-la no que tem sido denominado Projeto Santa Quitéria (PSQ).
O empreendimento pretende produzir, por ano, 1.050.000 (um milhão e cinquenta mil) toneladas de derivados fosfatados e 1.600 (mil e seiscentas) toneladas de concentrado de urânio para atender à produção de fertilizantes, ração animal e energia nuclear.
Assim, caso receba as licenças ambientais do IBAMA, o Projeto Santa Quitéria será responsável pela nefasta expansão do agronegócio e pelo consequente aumento do uso de agrotóxicos e transgênicos no Brasil[1]. Do mesmo modo, estará diretamente relacionado à instalação de usinas nucleares no país, empreendimentos envoltos em problemas históricos de segurança, lixo radioativo e alto custo operacional (GREENPEACE, 2008).
Para iniciar sua operação, o PSQ prevê a instalação de um Complexo Nuclear; um Complexo Mínero-Industrial; uma pilha de fosfogesso; uma pilha de estéril e uma barragem de rejeitos, além de outros sistemas auxiliares que serão utilizados em seus vinte anos de vida útil.
Após a produção, as toneladas de derivados fosfatados e concentrado de urânio pretendem ser transportadas, por via rodoviária, até o Porto do Mucuripe, no município de Fortaleza. Para isso, estão previstos quatro carregamentos de concentrado de urânio por ano, cada um com 25 contêineres que levarão 15 toneladas de material radioativo para a capital cearense. Apesar desse dado, as empresas responsáveis pelo empreendimento não apresentam em seu Estudo de Impacto Ambiental e em seu Relatório de Impacto ao Meio Ambiente (EIA-RIMA) um Plano de Segurança de Transporte e sequer inscrevem o município de Fortaleza na área de influência do projeto. Nesse sentido, a população da capital, assim como as populações dos demais municípios por onde passarão os contêineres carregados de material radioativo, não têm participado de nenhum processo de discussão sobre os riscos e os impactos que planejam atravessar seus territórios e permanecem desinformadas sobre a própria existência do projeto.
As pilhas e a barragem de rejeitos do empreendimento, por exemplo, serão depósitos de resíduos radioativos que continuarão no Sertão Central do Ceará por cerca de 80.000 anos. Uma delas alcançará o volume total de mais de 29 milhões de toneladas de metros cúbicos[2], o que equivale a um prédio de 30 andares e ao volume de doze piscinas olímpicas (NÚCLEO TRAMAS, 2014).
Com a ação dos ventos e das chuvas sobre essas estruturas, isso quer dizer que haverá material radioativo sendo continuadamente espalhado pelo solo, pelas águas e pela vegetação de diferentes áreas do estado, principalmente quando se verifica que, com ventos de apenas 16 quilômetros por hora, o urânio é capaz de se propagar por mais de 1.000 quilômetros.
É preciso levar em consideração, ainda, a possibilidade de vazamentos, derramamentos e desastres semelhantes ao recente rompimento da Barragem de Rejeitos do Fundão, no município de Mariana (MG)[3]. No caso de Santa Quitéria, Rigotto et al. (2014) apontam que, em períodos inferiores a 10 anos, chuvas torrenciais podem atingir o território e tanto a barragem de rejeitos como as pilhas de estéril e fosfogesso poderão perder massa e extravasar para além dos limites do empreendimento, fato que já foi verificado na mineração de urânio que a INB mantém em Caetité (BA). Eventos como esse levariam ao carreamento de Rádio-226 e Rádio-228, ambos solúveis em água, ampliando a contaminação do solo e dos veios de água subterrânea, já que inexiste ação mitigatória prevista no Estudo de Impacto Ambiental das empresas que não seja o aterramento e esse procedimento sequer consta no projeto para a pilha de fosfogesso, por exemplo (RIGOTTO et al., 2014).
Além desse contexto de contaminação ambiental, o Projeto Santa Quitéria prevê a utilização de 1 milhão e 100 mil litros de água por hora em uma região que se localiza no semiárido e que vivencia o sexto ano consecutivo de seca. No intuito de viabilizar esse objetivo, pretende contar com o apoio do Governo do Estado do Ceará para a construção de uma adutora que transportará a água do Açude Edson Queiroz até a jazida e elevará a demanda desse açude em 400% caso o empreendimento entre em operação (RIBEIRO, 2016).
De acordo com o Portal Hidrológico do Ceará (2017, on-line), entretanto, o Edson Queiroz está com 9,84% de seu volume, o que coloca em questão, além do excessivo consumo de água pela mineração e da incompatibilidade dessa atividade com a conservação da caatinga e dos ecossistemas locais, a inviabilidade hídrica do empreendimento.
Vale enfatizar, também, que a mineração de urânio e fosfato consumirá o equivalente a 125 carros-pipa por hora, enquanto as comunidades e os assentamentos do entorno da mina sobrevivem, em média, com o equivalente a 14 carros-pipa por mês. Esse dado evidencia, por si, que, caso o Projeto Santa Quitéria receba as licenças ambientais necessárias à sua execução, será responsável pela geração de uma injustiça hídrica que violará, entre outros aspectos, o uso equitativo dos recursos naturais – previsto no princípio 5 da Declaração de Estocolmo[4]– e o direito humano à água[5], especialmente em relação aos critérios jurídicos da disponibilidade[6] e da qualidade[7].
Além desses aspectos, cumpre ressaltar que diferentes pesquisas já atestaram relações entre exposição ao urânio – e aos outros elementos de sua série de decaimento, como o Radônio – e aumento dos casos de câncer.
Na Alemanha, por exemplo, Grosche et al. (2006) apresentaram evidências de aumento do risco de câncer no pulmão e Kreuzer et al. (2008) encontraram evidência de aumento de risco relativo entre Radônio e desenvolvimento de cânceres extrapulmonares. Na República Theca, por sua vez, Rericha et al. (2006) indicaram associação entre exposição ao Radônio e elevação na incidência de leucemia em mineiros subterrâneos de urânio. Do mesmo modo, na Polônia, Mészáros et al. (2004) também encontraram evidências de alterações citogenéticas (aberrações cromossomiais) de longo prazo em trabalhadores e ex-trabalhadores de minas subterrâneas devido à exposição a doses diferenciadas de Radônio, conforme sintetiza a pesquisa de Porto, Finamore e Chareyron (2014).
Todos esses dados, portanto, colocam em alerta as análises que são feitas sobre o Projeto Santa Quitéria, especialmente quando se identifica que o Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto ao Meio Ambiente (EIA-RIMA) apresentados pela INB e pela Galvani não contemplam informações quanto à emissão do Radônio e dos demais elementos da série de decaimento do Urânio; não elaboram uma simulação computacional de dispersão de poluentes ao longo da vida útil do empreendimento; não preveem a possibilidade de vazamentos, derramamentos e desastres envolvendo a pilha de estéril, a pilha de fosfogesso e a barragem de rejeitos; não avaliam as bacias hidrográficas na definição dos limites da área geográfica a ser direta e indiretamente afetada; subdimensionam o número de atingidos(as) e ainda são acompanhados por cartilhas com informações equivocadas a respeito dos impactos e dos riscos do projeto.
É preciso destacar que, no Ceará, um total de 156 comunidades camponesas, três bacias hidrográficas e mais de 60 (sessenta) municípios (incluindo a capital do estado) podem ser impactados com o Projeto Santa Quitéria. Além deles, todas as regiões agrícolas do Brasil e dos países para onde os fertilizantes e a ração animal forem exportados também poderão estar na rota de contaminação, pois o empreendimento planeja separar urânio e fosfato por meio de uma metodologia de extração elaborada recentemente (RIBEIRO et al., 2008) e ainda não aplicada em nenhuma planta industrial. Pesquisas apontam que a produção do fosfato a partir dessa metodologia não estará livre da presença de elementos radioativos, o que acentua o risco à saúde dos(as) consumidores(as) (PIRES DO RIO, 1999; HESS, 2014) e pode aumentar o número de atingidos(as) pelo projeto.
Cumpre enfatizar, ainda, que a estatal que pretende se instalar no Ceará é sucessora da empresa que realizou a mineração de urânio em Poços de Caldas (MG) entre os anos de 1981 e 1995 (PORTO; FINAMORE; CHAREYRON, 2014). Após a geração de impactos socioambientais e a exploração das reservas à exaustão, ela migrou de Poços de Caldas para Caetité (BA), onde a mineração de urânio ocorre desde o ano 2000.
Na Bahia, a INB também aglutina um conjunto de violações de direitos fartamente denunciado por comunidades e movimentos sociais locais e já reconhecido por diversas instituições, como o Instituto de Gestão das Águas e do Clima (INGÁ-Bahia), o Ministério Público Estadual, a Comissão de Pesquisa e Informação Independente sobre Radioatividade (CRIIRAD), a Plataforma Dhesca Brasil, o Greenpeace e o próprio IBAMA.
Entre as violações identificadas em Caetité, destaca-se a contaminação da água para consumo humano (GREENPEACE, 2008); a liberação de Urânio-238, Tório-232 e Rádio-226 para o meio ambientea partir dos vários acidentes verificados ao longo da operação do empreendimento (PLATAFORMA DHESCA BRASIL, 2011); o não monitoramento do Radônio, do Polônio-210 e de outras substâncias químicas na água subterrânea (CRIIRAD, 2015) e o ocultamento, por parte da INB, dos resultados do monitoramento da radiação gama, da deposição de poeira radioativa, da contaminação dos solos, da contaminação da água da chuva, da cadeia alimentar e das doses recebidas pelos trabalhadores da mineração (CRIIRAD, 2015).
No Ceará, desde 2010, pesquisadores(as) do Núcleo Trabalho, Meio Ambiente e Saúde (TRAMAS), da Universidade Federal do Ceará, em articulação com movimentos sociais locais, comunidades do entorno da Jazida de Itataia e outras universidades, analisaram os estudos ambientais apresentados pela INB e pela Galvani; realizaram estudos na região diretamente afetada e sistematizaram, além dos impactos e dos riscos aqui mencionados, um conjunto de outras irregularidades existentes no Projeto Santa Quitéria (ALVES, 2013; RIGOTTO et al., 2014; COSTA, 2015; MELO, 2015; MONTEZUMA, 2015; RIBEIRO, 2016). Essa sistematização foi entregue ao IBAMA, ao Ministério Público Federal, à Defensoria Pública da União e ao Escritório de Direitos Humanos e Assessoria Jurídica Popular Frei Tito de Alencar.
Em setembro de 2016, após analisar esses documentos, solicitar complementações às empresas e verificar o conteúdo de tais complementações, a equipe técnica do IBAMA emitiu um Parecer contrário ao empreendimento. Lá, são atestadas pela autarquia federal, entre outras irregularidades, a não comprovação da viabilidade hídrica, a péssima localização das pilhas de rejeitos, a ausência de medidas de mitigação quanto à possível contaminação radioativa das comunidades mais próximas e a falta de autorizações do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e da CNEN (Comissão Nacional de Energia Nuclear). Todavia, desde então, o Parecer está com a Direção do IBAMA, que, até hoje, não se pronunciou formalmente sobre o indeferimento do Projeto Santa Quitéria.
Esse silêncio tem preocupado as instituições e as pessoas físicas que assinam esta Carta. Em Caetité, por exemplo, no ano 2000, após o derramamento de 5 milhões de litros de licor de urânio das bacias de sedimentação da INB, uma equipe de fiscais da Coordenação de Instalações Nucleares (CODIN-CNEN) inspecionou o local e também elaborou um Parecer contrário ao início das atividades da empresa. Entretanto, a Diretoria da CNEN, à revelia do que foi constatado pela equipe técnica, concedeu a autorização para operação inicial da mineração na Bahia (PLATAFORMA DHESCA, 2011), permitindo que todo um ciclo de violação de direitos fosse concretizado na região.
Em virtude de exemplos como esse, manifestamos que NÃO PERMITIREMOS QUE ESSA HISTÓRIA SE REPITA NO CEARÁ!
CONCLUSÃO
Diante da inviabilidade hídrica da mineração de urânio e fosfato no Sertão Central do Ceará; da incompatibilidade dessa atividade com o bioma caatinga e a conservação dos ecossistemas do semiárido; dos danos da mineração de urânio aos municípios de Poços de Caldas (MG) e Caetité (BA); do exemplo demonstrado pelo rompimento da Barragem de Rejeitos do Fundão (Mariana-MG); das irregularidades do Estudo de Impacto Ambiental apresentado pela INB e pela Galvani em relação ao Projeto Santa Quitéria; da necessidade de conter a expansão do agronegócio e da energia nuclear em virtude de seus impactos socioambientais; da importância de produzir alimentos saudáveis – pautados na agricultura camponesa e agroecológica – e da relevância de proteger os direitos políticos, sociais, culturais, ambientais e territoriais resguardados pelo ordenamento jurídico brasileiro e pelo sistema internacional de proteção aos direitos humanos, as instituições e as pessoas físicas que assinam esta Carta solicitam à Direção do IBAMA o indeferimento do pedido de licenciamento ambiental do Projeto Santa Quitéria, com o consequente arquivamento do feito em razão de sua inviabilidade ambiental.
Pela concretização dos direitos humanos à vida, à saúde, à água, à terra, ao território, ao trabalho decente, à alimentação e ao meio ambiente; pelo acesso amplo e irrestrito à informação de qualidade e pelo respeito ao direito à participação da sociedade nos processos de decisão sobre os empreendimentos e as atividades econômicas que podem impactar diretamente sua segurança, seu bem-estar, sua saúde, seu ambiente e seus modos de vida, dizemos NÃO À MINERAÇÃO DE URÂNIO E FOSFATO NO CEARÁ!
Fortaleza-Ceará, 22 de março de 2017.
ASSINATURAS INSTITUCIONAIS:
Articulação Antinuclear Brasileira;
Articulação Antinuclear do Ceará;
Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco);
Associação Movimento Paulo Jackson – Ética, Justiça, Cidadania (BA);
Coletivo Flor de Urucum – Direitos Humanos, Comunicação e Justiça;
Comitê de Solidariedade com a América Latina (LAG – Noruega);
Fórum Ceará no Clima;
Instituto Terramar de Pesquisa e Assessoria à Pesca Artesanal (CE);
Movimento dos(as) Trabalhadores(as) Rurais Sem Terra (MST);
Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM);
Núcleo Trabalho, Meio Ambiente e Saúde (Tramas) – UFC;
Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares (RENAP);
REFERÊNCIAS:
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[1] “Desde 2008, o Brasil ocupa o lugar de maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Os impactos na saúde pública são amplos, atingem vários territórios e envolvem diferentes grupos populacionais, como trabalhadores em diversos ramos de atividades, moradores do entorno de fábricas e fazendas, além de todos nós, que consumimos alimentos contaminados” (CARNEIRO et al., 2015, p. 37). Entre os principais impactos dos agrotóxicos utilizados pelo modelo produtivo do agronegócio, destaca-se a contaminação do ar, dos solos e dos alimentos, inclusive do leite materno (CARNEIRO et al., 2015); o desaparecimento de ecossistemas (HOCSMAN, 2014); a contaminação de águas superficiais e subterrâneas (inclusive as de abastecimento humano) e a geração de doenças como neuropatias, imunotoxicidade; alterações endócrinas; alterações do sistema reprodutor, do desenvolvimento e do crescimento e neoplasias, entre outros danos à saúde (CARNEIRO et al., 2015, p.78).
[2] A pilha de fosfogesso é um depósito de resíduos da produção de ácido fosfórico que alcançará 70 metros de altura e terá 24.960.000 toneladas de material. A pilha de estéril, por sua vez, é um depósito de resíduos da produção de concentrado de urânio que alcançará 90 metros de altura e terá 29.533.272 toneladas de metros cúbicos de volume total.
[3] No dia 05 de novembro de 2015, ocorreu o rompimento da Barragem de Rejeitos do Fundão, localizada no Distrito de Bento Rodrigues, no município de Mariana-MG. A barragem pertencia à mineradora Samarco, controlada pela Vale e pela BHP Billiton. A tragédia deixou 19 mortos, 1.200 desabrigados(as) e mais de 3 milhões de pessoas afetadas e causou a poluição e a contaminação do solo, do ar, do meio ambiente cultural e de importantes reservas hídricas, como o Córrego Santarém, o Rio Gualaxo do Norte, o Rio do Carmo, o Rio Doce, os seus afluentes e as regiões estuarina, costeira e marinha. Além desses impactos, afetou comunidades tradicionais; agravou problemas de saúde; destruiu agricultura, pecuária, comércio, serviços e atividade pesqueira em toda a bacia hidrográfica do Rio Doce; comprometeu as infraestruturas públicas e privadas nas cidades atingidas; diminuiu a arrecadação tributária dos municípios; gerou prejuízos relacionados às ações emergenciais de mitigação dos efeitos do desastre e à perda de receita de alguns serviços (MPF, 2016, on-line) e alcançou, além de Minas Gerais e Espírito Santo, o litoral da Bahia. Antes do evento, a Consultoria VogBR havia expedido um laudo atestando que a barragem mantinha condições de segurança (FASE, 2016, on-line). Em 20 de outubro de 2016, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou a Samarco, a Vale, a BHP Billiton e a VogBR pelos crimes ocorridos. Junto às empresas, 21 pessoas também foram denunciadas por homicídio qualificado com dolo eventual, quando se assume o risco de matar (MPF, 2016, on-line).
[4] De acordo com o Princípio 5 da Declaração de Estocolmo (1972), proveniente da I Conferência da ONU sobre o Ambiente Humano, “os recursos não renováveis da terra devem empregar-se de forma que se evite o perigo de seu futuro esgotamento e se assegure que toda a humanidade compartilhe dos benefícios de sua utilização”.
[5] O direito humano à água e ao saneamento foi reconhecido pela Resolução A/RES/64/292, da Assembleia Geral das Nações Unidas, em 28 de julho de 2010 (ALBUQUERQUE; ROAF, 2012; ASSEMBLEIA GERAL DA ONU, 2010) e pela Resolução A/HRC/RES/15/9, do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em setembro de 2010 (ALBUQUERQUE; ROAF, 2012). De acordo com a ONU, seu conteúdo envolve cinco grandes critérios: a disponibilidade, a qualidade (segurança), a aceitabilidade, a acessibilidade física e a acessibilidade financeira (ALBUQUERQUE; ROAF, 2012).
[6] A disponibilidade refere-se ao fato de que os Estados são responsáveis por garantir sistemas e estruturas que assegurem os serviços de água e saneamento em todas as esferas da vida, inclusive no trabalho. (ALBUQUERQUE; ROAF, 2012, p.41, traduziu-se).
[7] A qualidade (ou a segurança) vincula-se ao fato de que a água não deve conter contaminantes orgânicos ou químicos que possam ser prejudiciais à saúde (ALBUQUERQUE; ROAF, 2012, p.41, traduziu-se).